quarta-feira, outubro 05, 2005

CAPÍTULO VI

Capítulo VI

22:55h – Parque Industrial

_Pessoal! Atenção! Cumpram apenas o plano e sobretudo não façam disparates.
_Bora lá! Estamos em cima da hora.
O Lim entregou a cada um de nós um daqueles mini-rádios Motorola e duas armas. Um punhal para colocarmos na perna e um pistola automática para pormos à cinta. Colocámos todos um capuz preto e eles saem do carro. No meio do pouco nevoeiro, por cima da calçada meio baça, vejo-os a atravessarem a rua para junto do armazém.
Boa altura para enrolar outro e descontrair ao som de Thievery Corporation. Iá. Loucura total.
Esta é a parte que eu mais curto. A imaginação a funcionar. Imaginar o que se está a passar lá dentro. Mais do que imaginar, visualizar. Isso mesmo. Visualizar, acompanhar todos movimentos, todas as acções e toda a situação. E o melhor de tudo é saber que estou com a moca. A curtir toda a situação.
Mudo de CD. Placebo, “Special K”.
Claquetes!
Acção!
Estou a ver os três a entrarem no armazém. Completamente vestidos de negro. O Lim vai à frente. Diz aos outros para avançarem. Está um guarda sentado numa cadeira de madeira, com os pés apoiados em cima da secretária, também ela de madeira. Está a ler o jornal. O Lim avança para ele com a pistola em punho e diz-lhe para ele não se mexer e não falar. O guarda assusta-se e quase cai ao chão. O Gazela intromete-se e diz-lhe que é um assalto. O guarda rende-se e eles prendem-lhe os pés e as mãos atrás das costas com fita adesiva negra. Agora estão a amordaçá-lo e deixam-no no chão. O Gazela vai para a secretária do guarda e desliga o rádio dele, pois sabe que era normal este guarda esquecer-se de o ligar e assim os outros não achariam estranho.
O Pedro tranca a porta da frente com a cópia da chave que o Gazela tinha conseguido quando trabalhou lá. Avança para junto do Lim e caminham os dois para a porta que separa a portaria da área dos escritórios.
Iá. Um guarda apanhado! Tudo a correr OK! Não está a falhar nada.
Eis que o meu telemóvel começa a tocar. Olho para o visor e vejo que é a Mena.
_Merda só me faltava mais esta. Foi só pensar que estava tudo a correr bem que acontece logo merda.
Ligo o carro. Ela vai ouvir o barulho do carro e eu posso lhe dizer que estou em viagem com os meus Pais.
_Tou Mena?
_Olá anjo! Onde estás? Precisámos de conversar.
_Estou com os meus Pais. Vamos buscar o César. Eu já te tinha dito.
_Então fazemos assim: quando chegares, não interessa a que horas, liga-me e vamos ter os dois a algum lado.
_Hoje não posso. Tenho que estar com o meu primo.
_É mais importante do que nós, o teu primo?
_Não amor, mas o rapaz já não está comigo há 2 meses. E eu também tenho saudades dele.
_Pois então só te digo que se hoje ...
_Hoje?
_Sim! Hoje! Se não vieres ter comigo, acredita que nunca mais me pões a vista em cima. Aceito a bolsa de estudo para Londres.
_Mena! Não podes fazer isso. É injusto.
_Já te disse e não repito.
_Mas, Mena.
_Adeus anjo.
Desligou! Não acredito. Agora é que foram elas. O que vou fazer agora? Não posso largar os rapazes, mas também tenho que ir ter com ela. Ora bem! Se a recolha nocturna termina à meia-noite e meia e se ela disse que podia ser a qualquer hora, então não tenho que me preocupar mais com isto. Sim já está resolvido por si mesmo. Vamos mas é ver onde estarão os rapazes.
São onze e dez. Já estão no escritório e já anularam mais dois guardas. O Gazela já foi desligar os sensores e o alarme principal do cofre. Conseguem agora ver pelas pequenas televisões os outros dois guardas há porta do cofre. O Pedro avança com o Lim para a porta que os separam dos outros dois guardas. O Gazela olha para as televisões e diz-lhes as posições dos dois guardas. Eles entram e facilmente tomam conta da situação.
O Gazela fica nos escritórios pois ás onze e meia vão ligar da central de segurança e ele tem que dar os códigos. Só aí é que começam a arrombar o cofre pois se o Gazela der os códigos errados, temos que interromper a recolha.
Toca o telefone. O Gazela atende e dá os códigos. Silêncio. Não há resposta. O Lim e o Pedro começam a encaminhar-se para a entrada. Estão os três a suar. Continua a não haver resposta. Vamos ter de abortar. Volto a ligar o carro para não perdermos tempo. Olho para a porta da entrada porque eles devem estar a sair a qualquer momento.
Felizmente ninguém saiu. Yes! Quer dizer que não foi necessário o plano de fuga número um. Os rapazes não sofreram nada. Os códigos foram aceites e eles começam a arrombar a porta do cofre. O Pedro é o especialista naquelas cenas de rodar. Encosta o ouvido à porta e começa a rodar as cenas. Roda para um lado e para o outro. Já conseguiu um. Passado uns minutos já estão mais dois. Só falta um. Conseguiu. O Pedro já acabou a sua especialidade. Está na vez de entrar outro.
Entra em cena o Lim. Um dos seus hobbies é ser pirata informático. Consegue quebrar qualquer password. Esta é também uma das razões pela qual a judite o persegue. Conta-se que ele entrou pela internet no computador do Banco de Portugal e retirou para uma conta na Suiça uma pipa de massa.
O Lim abre uma tampinha da porta do cofre onde estavam os botões de código digital e retira os fios para fora. Une os fios que saem do cofre ao seu mini-computador e liga-se à internet.
Como ele o faz? Não sei. Acreditem. Mas, segundo dizem, corre uma data de sites de amigos piratas e passado meia hora já tem os códigos na mão. Desliga o seu mini-computador e torna a ligar os fios do cofre. Fecha a tampinha e digita o código conseguido. Roda o fecho e ... Click! Está aberta a porta. Agora é só encher os sacos do lixo com o dinheiro e pirarmo-nos daqui.
Vocês fazem ideia da quantidade de notas que são cinco milhões de euros? Eu acho que deve ser bué. Deixa ver ... cinco milhões de euros a dividir por quinhentos ... dá ... dez mil notas de quinhentos euros. É muita merda. Quantos sacos serão necessários? Uns vinte? Sei lá. Nem me interessa. Eu quero é o meu dinheiro.
Lá estão eles a encher os sacos com a massa. É só dinheiro a voar. Lindo... notas ... de dquinhentas brasas. Saco pós saco enchem eles com as notas. Que espectáculo! O Lim a segurar num e o Pedro e o Gazela a carregarem maços de notas para dentro dele.
Começa a tocar o telefone. O Gazela caminha para lá e responde o código. Faz-se silêncio.
Neste preciso momento estou a ouvir Morcheeba, “World looking in”. Acho que estou a viver o momento que eles estão a viver.
Um silêncio de ensurdecer ... de arrepiar ... de fazer gelar o mais quente dos homens. Começam a tremer. Depois a suar. E finalmente a se aterrorizar. O código estava mal! Merda! Temos que fugir!
Primeiro, pegar no máximo de sacos. Depois sair a toda a velocidade, o mais rápido possível. Vejo-os a correr com ares aterradores, de arrepiar. Correm o mais rápido que podem. Carregando vários sacos cada um. O Lim vem à frente, depois o Pedro e por ultimo o Gazela. Estão a chegar à porta e vão sair.
Abro os olhos e vejo a porta do armazém a abrir. O Lim está a gritar qualquer coisa. Merda fomos apanhados!
_Prepara para arrancar!!
_Já está Lim!!
_Abre a merda da mala!!
_O Gazela é que tem a chave da mala!!
_Eu não tenho chave nenhuma!! O Pedro é que a debe ter!!
_Não, no plano diz que se o Gazela perder a chave podemos utilizar as que estão na ignição.
Começa-se a ouvir o som de sirenes a aproximar. Merda o que me está a acontecer? Pega na chave man. Mas para isso tenho que desligar o carro. E depois? Desliga man estás parvo ou quê? Desligo o carro e atiro o porta-chaves para o Gazela. As chaves batem-lhe na cara e caem para debaixo da Nissan. O Gazela cai ao chão agarrado aos olhos.
_Merda. Acertou-me nos olhos. Não consigo ber nada.
O Lim abaixa-se e apanha o porta-chaves. Atira-o para o Pedro para ele abrir a mala.
_Abre a mala Pedro!! Rápido!!
_Já está!!
Começam a carregar a mala com os sacos e o Gazela continua no chão agarrado aos olhos e a gemer.
_Merda! Só a mim. Não consigo abrir os olhos.
_Tem calma man!! Eles já te ajudam a entrar!!
Acabam de carregar o carro, fecham a mala e vão ajudar o Gazela. Entram e eu ponho a chave na ignição. Rodo a chave e o carro não pega. Rodo outra vez e nada.
_Liga o carro rápido!! Já se oubem as sirenes bem perto!!
_Não quer pegar!! Pega!! Merda!! Pega!!
Vou rodando as chaves e o carro não pega. As sirenes já sufocam e consigo ver luzes lá ao fundo. Torno a rodar as chaves e o barulho de motor a morrer começa a ficar cada vez mais repetitivo. Até que ouço uma voz lá de trás.
_És o melhor arranca!!
Não sei se foi o Pedro ou o Gazela, aliás a voz nem parecia de nenhum deles, mas o certo é que resultou. Rodo as chaves e o carro pega.
_Bamos fugir!! Bora Lá!!
O Lim pega no CD de fugas e começamos a curtir um som de Queen´s, “Under Pressure”. Era mesmo isso, sobre pressão. O Lim gostava de nos ver assim. Ele dizia sempre que os melhores momentos que viveu foram sobre pressões em fugas. Momentos de pura adrenalina. De arrebentar qualquer coisa.
Vamos a cinquenta. Não posso chamar a atenção de ninguém para nós. Assim ninguém se vai lembrar de nos terem visto. É perfeito. E eu sou muito bom, mesmo sobre pressão. Olho pelo retrovisor e vejo as luzes dos carros da polícia a chegarem ao armazém. Ninguém vem atrás.
_Fixe. Não bem ninguém atrás de nós.
_Era mesmo isso que eu ía falar man. Tiraste-me as palavras da boca.
_Eu tirava-te era os dentes palhaço!
_Tem calma Pedro. Quem manda aqui ainda sou eu. Todos nós vimos o que aconteceu. Ele não teve culpa nenhuma. O carro não pegava.
_Mais tarde tiramos isso a limpo Lim.
_Para onde vamos agora, Lim? É para o Fanicos não é man?
_Estou a ver que estudaste o plano de fuga dois.
_Eu disse-te que era canja man.
Fomos para o Fanicos e parei a Nissan nas traseiras. Saímos todos e começámos a levar os sacos para dentro.
_Pedro agarra é o último. Bamos entrar e curtir!!
Entrámos e sentámo-nos à volta de uma mesa. O Lim colocou um copo a cada um e abriu uma garrafa de Vodka.
Boa! Vamos curtir bué. Espera aí ... ainda tenho um problema chamado Mena. Não posso ficar aqui muito tempo. Tenho de arranjar uma maneira de vazar daqui.
_Bebam à vontade pessoal. Hoje é por conta da casa.
_Boa Lim! Pedro manda a bodka para aqui.
_Toma lá Gazela. A tua pronuncia não engana ninguém, és mesmo de Braga.
_Tens problemas com isso meu?
_Com isso não pá. Mas com o facto de teres disfarçado para não carregares com os sacos. Aí é que o caso muda de figura.
_O que estás a insinuar meu?
_Pessoal tenham calma. Não quero confusões dentro do meu café.
_O Pedro tem razão Gazela. Já não te doem os olhos man?
_Então Gazela? Não dizes nada?
É verdade. Nem me tinha apercebido disso. Quando é que ele começou a ver? Deixa cá ver ... Já sei. Foi a partir do momento em que saiu do carro quando chegamos aqui ao café. Malandro.
_Por minha parte só te desculpo se enrolares um man.
_Puto pára com isso! Gazela, neste momento ... neste preciso momento ... só me apetece ... dar cabo de ti. Anormal!
Ao mesmo tempo que o Lim diz isto, dá um pontapé na mesa. Os copos entornam-se, a garrafa cai em cima da mesa e rola para o chão. Trás. Parte-se no chão. A mesa bate no pobre do Gazela que se desequilibra e cai de costas no chão. O Lim salta para cima da mesa e depois para cima do Gazela. Até que cai sentado em cima dele.
_Lim! Pára! Estás a magoar-me!
_Eu vou é dar cabo de ti.
Vejo o Lim a sacar o punhal da perna e a encostar à garganta do Gazela. O Pedro arranca para eles e agarra o braço do Lim.
_Estás doido Lim? Solta o rapaz!
_Eu vou ensiná-lo a nunca mais fazer merda.
_Larga-me meu.
_Ajuda-me. Não consigo segurar o braço dele.
Eu não me mexo. Não percebo porquê. Algo me impede. Será o facto de achar que o Pedro tem cabedal suficiente para o Lim? Será que quero que o Lim dê cabo do Gazela para ficarmos com mais? De certeza que não trouxeram os cinco milhões e a dividir por quatro cai mais a cada um.
Zás! A garganta do Gazela parece uma fonte de sangue. Ainda o ouço a emitir um som tipo um gargarejo. Até que ... Pimba! Cai no chão. Não se mexe mais. Está morto. Silêncio. Nenhum de nós emite qualquer som. O Gazela já não está entre nós. O Lim acabou com ele. E continua um silêncio de morte. Até que o Pedro toma a iniciativa.
_Vamo-nos sentar todos para acalmarmos os ânimos.
Sentamo-nos e comecei a enrolar um. O Pedro bebia os restos de todos os copos que estavam na mesa. O Lim sentou-se e pousou a faca ensanguentada em cima da mesa. Pôs as mãos na cabeça e pousou os cotovelos em cima da mesa.
_Não sei o que me deu.
_Mataste o gajo man.
_Não sei o que dizer. Foi mais forte que eu. Comecei a pensar que o gajo esteve o tempo todo a gozar connosco e que podíamos ter sido apanhados por causa dele. Não sei. Não entendo. Não me consegui conter.
_O que está feito, está feito. Vamos é livramo-nos do corpo. Eu também não gostava muito dele.
_Não digas isso Pedro. O Gazela era fixe man. Lim, o que vamos fazer agora?
_Tenho que me acalmar. Deixa cá ver.
Levantou-se, pegou numa garrafa de whisky e começou a beber. Eu já estava meio tonto.
_Queres Pedro? Já está a queimar.
_Obrigado. É fixe a tua cena?
_Com garantia do Lim, man. Do melhor que há.
_Pessoal! Deixem-se de merdas. Vamos resolver isto primeiro. É verdade, onde estará o meu primo? Ainda não me ligou.
O Lim liga para o Filipe e começámos a ouvir um telemóvel a tocar no quarto ao lado.
_Lim! O teu primo está cá? Aqui no café?
_O gajo deve estar doido, man. Quer dizer que a judite também está cá. Que cena man.
_Deve ter sido uma coincidência. O meu primo não vinha para aqui. Eu disse-lhe para ir para onde quisesse menos para aqui.