sexta-feira, setembro 30, 2005

CAPÍTULO V

Capítulo V

Chego a casa, entro e vou para o meu quarto. Sento-me na cama e ligo a aparelhagem. Oiço na rádio que à noite ia estar frio, chuva e vento. O tempo perfeito para uma recolha nocturna. Vai ser o máximo.
_Então pá! Tás fixe?
Grande susto. É o Rui a entrar mais uma vez pela minha janela. Este gajo não tem emenda.
_Merda man. Já chega! Ou começas a usar a porta ou acabo com a cena para ti!
_Tem calma pá. Estás muito nervoso. Passa-se alguma coisa?
_Não. Acabei de ter uma discussão com a minha empregada e ainda estou nervoso.
_Não descarregues é em mim, pá. Como é tens aí a cena?
_Tenho, toma.
_Baril! Estava mesmo a precisar. Toma lá o dinheiro.
_Estamos quites. Quando precisares já sabes.
_Tá pá. Obrigado. Tchau!
E lá foi ele de novo pela janela. Este gajo é que é doido. Uma vez Rui, sempre Rui.
_Menino! Menino! O jantar está servido!
_Já vou Tina! Já vou!
Olho para o relógio e vejo que são oito menos dez. Quer dizer que vou acabar de jantar por volta das oito e vinte, mudo de roupa e vou buscar o carro do Lim em frente ao Fanicos, para depois ir ter com o Gazela. Iá. Tenho tempo mais que suficiente.
Desço as escadas e entro na sala de jantar. Os meus Pais já estão sentados à mesa. Cumprimento-os com um beijo na cara a cada um.
_Que tal o dia hoje, Pai?
_Correu bem e as tuas aulas?
_Mais ou menos. A matéria está cada vez mais difícil. Não tem sido nada fácil acompanhar as aulas.
_Tens é de ter a cabeça no lugar. Hoje em dia quem não tem curso vê-se nas horas para triunfar. Não é Pai?
_Tens razão Mãe.
Os meus Pais tratam-se assim desde que eu nasci. Por Mãe e por Pai. E eu acho super-fixe. È engraçado como há pequenas coisas que nos conseguem tocar tanto.
_Mãe, sabes perfeitamente que eu me esforço. Tenho estudado bastante.
_Nós esperamos que isso seja verdade, mas duvidamos muito. Não é Pai?
_É verdade. Estamos muito preocupados com as tuas atitudes. Sabes filho, há uma altura da vida em que temos que parar um bocado para pensarmos no nosso futuro. Aquilo que queremos ser mais tarde. Não podes meter sempre o amor à frente de tudo.
_O teu Pai tem razão. O amor não está sempre do mesmo lado que a razão.
_Mãe! Pai! Então? Já sou crescido o suficiente para saber distinguir o certo do errado.
_Sabes, eu e o teu Pai não temos tanto a certeza.
_Estejam descansados. Eu sei o que faço e tenho consciência disso.
_Esperamos bem que sim.
Acabo de jantar e vou para o meu quarto. Ligo a aparelhagem e meto um CD dos REM. Programo a aparelhagem para não parar nunca de tocar e fecho a porta do quarto à chave. Assim posso sair pela janela e os meus Pais vão pensar que eu não saí esta noite. Já tenho um alibi. Os meus Pais jurariam que eu estive toda a noite a ouvir musica no quarto. Mesmo que batam à porta não era a primeira, nem a segunda vez que eu adormecia a ouvir musica no meu quarto à noite. Mais uma vez a minha imaginação me safou. Já tenho um alibi e ainda nem saí de casa. Iá. Nem preciso de comprar um. Fixe.
Salto pela janela e vou ter ao Fanicos. Lá está o carrinho do Lim. Não. É claro que não é o Z3. Somos quatro. O Lim tem muitos carros. E este sou eu que o vou estrear. O Lim compra sempre um carro para os golpes. Diz que dá sorte. Para mim dá, sou eu que os estrio. Desta vez resolveu comprar uma Nissan 4x4. Super-fixe. Cinzenta, com a caixa atrás fechada, senão as cenas da recolha nocturna voavam. O Lim sabe o que faz e compra sempre o mais adequado ao golpe.
Como é que eu sei que no meio de tantos carros estacionados qual vai ser o meu? Eu disse-vos que o plano era perfeito. Estava lá uma fotografia da Nissan, nos planos. A chave? Elementar caríssimos. Está sempre colocada dentro do cano do escape. Vêem?
Pego na chave e ligo o carro.
O plano vai ao pormenor de já estar colocado o CD para o golpe. Hoje meus amigos vamos escutar Vivaldi. As quatro estações. Lindo!
Chego à casa do Gazela e lá vem ele. Com os seus longos cabelos castanhos claros, aos saltos como uma gazela. Ao perto é que ele é estranho. Tem a cara com muitas borbulhas, usa óculos com lentes amarelas rectangulares e é super-magro.
_Como é Gazela? Tudo?
_Taba a ber que não, meu. Mas estás na hora combinada. Bora lá!
Há! É verdade! O Gazela é de Braga, não estranhem a pronúncia. É um tipo fiel e bué de fixe.
Nem foi preciso desligar o carro. Tão depressa apareceu como entrou no carro.
_Tens que me indicar o melhor caminho para a casa do Pedro.
_É simples. Bais sempre em frente, biras à esquerda na farmácia e na primeira à direita.
_E depois?
_Paras e eu dou-lhe um toque para o télélé. Ele não quer que tu saibas onde ele mora. Aliás ninguém sabe onde ele mora.
_E é de confiança este Pedro? Não achas estranho ninguém saber onde ele mora?
_De certeza que o Lim sabe. Ele sabe tudo de toda a gente.
_Agora é aqui, náo é?
_Isso! Bira aqui à direita e pára. Tou Pedro?
_ (...)
_Já chegamos! Bora lá!
_(...)
_Até já!
Foi tudo uma questão de minutos e entra na Nissan um individuo de raça negra. Fisicamente bem constituído, com uns enormes olhos castanhos e todo vestido de preto.
_Como é pessoal? Tá-se?
_Tudo Pedro! Tá-se fixe.
_Tá-se bem Pedro. Prazer.
Cumprimentámo-nos e arrancámos para a casa do Lim. O Pedro abriu o telemóvel dele e retirou o cartão. Partiu-o a meio e atirou-o pela janela fora.
_Porque desfizeste-te do cartão? Não bais precisar mais dele?
_Então a partir de agora não é tudo com os rádios?
_É verdade Gazela. O Lim nos golpes só usa rádio e se fores apanhado não tens como provar que ligaste ao Pedro. Bem pensado man.
_Obrigado. Sou profissional naquilo que faço.
Paramos a cerca de cem metros da casa do Lim. Estava tudo a correr conforme o plano. Lá estava o carro da judite, um Peugeot 306 verde com dois agentes que não tiravam os olhos da casa do Lim. Olho para o meu relógio e vejo que são dez e meia. Movimento. Sai alguém da casa do Lim e entra no Z3. É o primo dele e a judite segue-o. Yes. Estamos no caminho certo. Sai mais alguém. É o Lim. Arranco e vou apanhá-lo à porta de casa. O Gazela vai para o banco de trás e o Lim entra para o lugar do morto.
_Por pouco não vos via. Que merda de nevoeiro é este?
_Foi o Pedro que enrolou um man. Acomoda-te que está na hora.
_OK! Pessoal só digo isto uma vez, por isso escutem com toda a atenção.
_Bamos indo. Falas pelo caminho. Pedro dá-me uma passa.
_Toma! Pega no cinzas também.
_Se alguém for apanhado, o que eu duvido, ninguém, repito, ninguém dá com a língua nos dentes. Vocês já me conhecem e se há coisa que não tem perdão é a traição. Por isso mantenham a cabeça fria e nada de disparates. Era capaz de vos perseguir até aos confins do Inferno para me vingar.
_Tá descansado man. Já nos conheces e sabes como trabalhamos. Pelo menos a mim e ao Gazela.
_É berdade Lim!
_Vocês estão a descalçar a botinha para mim? É isso? Já actuei com o Lim várias vezes. E se ele me escolheu é porque sou o melhor. Não duvidem.
_Tens razão Pedro. És o melhor, mas aquilo que disse ainda à pouco, é para todos. Sem excepções. Tenham juízo e ninguém sai prejudicado. Este pode ser o nosso último trabalhinho. Por isso, e saia o gato!
Esta expressão do Lim é fabulosa, “_E saia o gato!”. Não conhecem? É simples. Eu conto-vos.
Era uma vez um ratinho que vivia dentro de uma parede atrás de um enorme armário. Cada vez que o ratinho saía da sua toca para ir buscar comida, era confrontado com a presença de um terrível gato. O ratinho temia o gato e começou a emagrecer tanto que resolveu, que naquela noite, tinha de sair de qualquer maneira. Quando se aproximou da porta da toca viu o gato a fumar um enorme charrão. O gato acaba de fumar e atira a ponta para baixo do armário. Aí o ratinho pensou, se não como nada então vou fumar esta ponta para enganar o estômago. Dá duas passas e começa a ficar com a cabeça a andar à roda. Sai da toca cá para fora. Cerra os dois punhos e com um movimento super-cómico de braços e pernas diz “E saia o gato!”.

5 Comments:

At segunda-feira, outubro 03, 2005 12:05:00 da tarde, Blogger Bino said...

Esta merda está muito fixe. Li os capítulos todos de seguida.
A acção desenrola-se sempre a um ritmo perfeito, boas descrições, personagens curtidas, tá impecável.
Não sei porquê estou naquela que o golpe vai dar merda. O Pedro não me inspira confiança.
Fico à espera da continuação, quando aqui entrei, vindo a partir dum link do teu blog não esperava que isto estivesse tão bem escrito.
Um abraço.

 
At segunda-feira, outubro 03, 2005 12:06:00 da tarde, Blogger Bino said...

Quando digo que o Pedro não me inspira confiança, quero dizer que desconfio que ele seja da Judite.

 
At segunda-feira, outubro 03, 2005 3:51:00 da tarde, Blogger Dra. Laura Alho said...

Estive a ler a história desde o começo. Está porreira :) Continua *

 
At terça-feira, outubro 04, 2005 12:56:00 da tarde, Blogger Ana said...

Ok!Tou muito curiosa...quero saber o fim!
Tá muito fixe!

 
At terça-feira, outubro 04, 2005 1:11:00 da tarde, Blogger Poor said...

que pandilha!:)

 

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